
As greves climáticas de Greta Thunberg estão a mudar hábitos

Instituto suíço revela que 30% dos helvéticos trocaram carro por bicicleta e reduziram viagens de avião, na sequência das greves climáticas iniciadas pela ativista sueca. Agravar a tributação dos aviões para investir nos comboios, que chegam a ser duas vezes mais caros, é o repto ambientalista e a ousadia francesa.
Afinal, as greves climáticas da ativista sueca Greta Thunberg influenciaram mesmo cidadãos europeus a mudar os seus hábitos de mobilidade e de consumo. Um estudo publicado este mês pelo Instituto Federal Suíço de Tecnologia de Lausanne, analisou o impacto global das ações promovidas pelo movimento internacional Greve Climática Estudantil, tantas vezes subestimado, e concluiu que 30% dos residentes suíços afirmaram ter alterado os seus hábitos de transporte, consumo e reciclagem, na sequência dos protestos.
Uma boa notícia para assinalar a Semana Europeia da Mobilidade, a mostrar que a ação coletiva pode ter impacto na sociedade. E também pode ser uma forma de pressionar as instituições europeias e governos nacionais a acelerar medidas de preservação ambiental, agora que “o planeta Terra está a entrar na fase de ebulição” perante o contínuo aquecimento global, tal como alertou este mês o secretário-geral da ONU, António Guterres.
Mais de 1200 pessoas com idades entre os 18 e os 74 anos, que não participaram nas greves, foram questionadas sobre os seus hábitos ambientais antes e depois dos protestos. E cerca de 30% responderam que mudaram a forma de se transportar, andando mais a pé ou de bicicleta, evitando viajar de avião e escolhendo destinos de férias mais próximos de casa. Na frente alimentar, referiram procurar produtos locais e orgânicos, comer mais refeições vegetarianas e fazer um maior esforço para reduzir os resíduos de plástico, na sequência dos protestos estudantis.
"Os nossos resultados mostraram que as pessoas se tornaram mais conscientes de como o seu comportamento afeta o ambiente e que estão em curso mudanças significativas a nível individual", diz Livia Fritz, investigadora e principal autora do estudo, citada pelo Euronews. “Também concluímos que as mudanças feitas a nível individual podem levar a uma mudança social mais ampla, desde que sejam apoiadas por uma ação política simultânea”, acrescentou.
A “greve escolar pelo clima” foi iniciada por Greta Thunberg em 2018 para exigir ação política contra a crise climática, tendo inspirado um movimento global que envolveu cerca de 4 milhões de estudantes em 150 países. O agendamento das greves às sextas-feiras continua a fazer caminho um pouco por todo o mundo.
Trocar o avião pelo comboio
Ao mesmo tempo que se joga uma batalha contra o tempo para descarbonizar totalmente a indústria automóvel, já na próxima década, algumas mudanças podem ser feitas já, se houver vontade política para incentivar o uso de meios de transporte menos poluentes. Uma das idiossincrasias mais perversas para o ambiente é a disparidade de preços entre as viagens de avião e de comboio dentro do espaço europeu. Em Julho, a organização ambientalista Greenpeace publicou uma análise onde se conclui que viajar de comboio custa, em média, o dobro do que voar.
O relatório comparou os custos dos bilhetes de avião e de comboio em 112 rotas na Europa, incluindo 94 ligações transfronteiriças.
A França é, até agora, o país que mais se destacou na abordagem a esta disparidade. E anunciou este verão que vai aumentar os impostos sobre os voos para investir mais nos seus caminhos-de-ferro. O objetivo é tornar as viagens de comboio mais atraentes, reduzindo a diferença de preços face ao avião, permitindo reduzir as emissões.
O setor da aviação não gostou e ripostou, argumentando que aumentar as taxas à aviação vai roubar recursos para os seus esforços no sentido de vir a adotar o hidrogénio como fonte propulsora até 2050. A verdade é que o setor da aviação beneficia de impostos mais baixos.
Aqui fica um exemplo apurado pela Federação Europeia de Transportes T&E: num voo de Paris para Barcelona, a companhia aérea não só não paga IVA, como também está isenta do imposto sobre o combustível; na mesma viagem de comboio, a empresa ferroviária paga um imposto sobre a energia e um IVA sobre os passageiros. Isto significa custos mais elevados para a empresa, que se refletem nos preços dos bilhetes.
"Numa situação de crise climática, conceder isenções fiscais a um setor super poluente é incompatível com os desafios atuais", afirma Jo Dardenne, diretora para a área da aviação do grupo de campanha de transportes limpos da T&E.
Aquela organização calculou que, se todas as isenções fiscais do setor da aviação fossem suprimidas em toda a Europa em 2022, seriam arrecadados 34,2 mil milhões de euros.
"Não é o comboio que é caro. É o avião que não é suficientemente caro", disse o diretor executivo dos caminhos de ferro franceses SNCF, Jean-Pierre Farandou, em 2021, abrindo uma nova frente de discussão. É verdade que as viagens aéreas mais caras não são tão boas para o turismo. Mas as crises climáticas são um risco muito maior para o setor, bastando para isso pensar nos recentes incêndios florestais no Canadá, Itália ou Grécia, as frequentes ondas de calor ou as tempestades e inundações devastadoras na Eslovénia, Espanha e um pouco por todo o mundo.
Carla Aguiar