
É necessário redesenhar as cidades para criar mais espaço para pessoas e menos para os carros

Cidades com menos espaços para parques de estacionamento e mais incentivos para tornar a utilização dos transportes públicos uma regra e não a exceção. Foi um dos temas em debate no painel "Como é que a IA vai moldar as cidades do futuro?", no segundo dia da Mobi Summit.
Para Francisco Costa, arquitecto e consultor em Urbanismo e Mobilidade na Câmara Municipal de Lisboa, a Inteligência Artificial (IA) não vai roubar trabalho aos arquitetos e vai aumentar a “quantidade de trabalho que conseguimos produzir e o nível da discussão”. No seu entender, as pessoas vão continuar a procurar, nas cidades do futuro, “mais espaços verdes, mais bancos e esplanadas”, realçando que o clima em Portugal é ideal para esse cenário. Com a IA, os cidadãos terão a capacidade de “exigir mais” dos municípios, referiu.
Confrontado para a necessidade das cidades continuarem a precisar de parques de estacionamento, apesar de desejaram cada vez mais espaços verdes, Francisco Costa admite que é necessário alterar a forma como os cidadãos se movimentam nas cidades. “É preciso que as pessoas sejam incentivadas a deslocarem-se de forma diferente. Andar mais de bicicleta e de autocarro ”, disse. “Se houver uma faixa dedicada [aos transportes públicos] será mais fácil, mais prático e as pessoas chegam a horas ao trabalho, vão buscar os miúdos à escola e, estamos ainda assim, a libertar espaço, porque uma grande percentagem das ruas é ocupada por carros”.
No mesmo sentido, Mauro Costa Couceiro, investigador integrado do ISTAR-ISCTE e fundador do iBAG UIC Barcelona, explicou que para transmitir esta ideia aos cidadãos e evitar a criação de mais parques de estacionamento é fundamental incentivar a “partilha de veículos” e a utilização de carros autónomos. “Podem partilhar o veículo, por exemplo com o vizinho, partilhar energia e fazer uma transição muito rápida”, explicou.
Já Damiano Cerrone, co-fundador da UrbanistAI , acredita que a única forma de tornar as cidades mais verdes é “reduzir os movimentos no centro para que cada carro precise de menos dois lugares de estacionamento. Estamos a falar de 60 a 70 metros quadrados por carro. Em média um carro precisa de quase o dobro do espaço que uma pessoa num apartamento”, observou. Segundo Francisco Costa a questão é mais complexa. Além de ser necessário criar “melhores transportes públicos, mais ciclovias e passeios mais confortáveis”, o consultor em Urbanismo da Câmara Municipal de Lisboa defendeu também que é necessário “ ter cidades mais densas”, reduzindo as distâncias de transportes. “Precisamos de casas a preços acessíveis para o trabalhador médio no centro da cidade, assim as pessoas saem dos arrabaldes e vão para o centro”, reduzindo também a utilização do carro.
Questionados ainda sobre a utilização da tecnologia e da IA para a redução de mortes por acidentes rodoviários nas cidades, Mauro Costa Couceiro acredita que a redução será acentuada, mas alerta que vão continuar a existir “acidentes” e “alguém vai dizer que as máquinas estão a matar-nos”, disse. Francisco Costa observou que nas cidades já existe essa solução: “Basta reduzir o limite de velocidade. Sabemos que as hipóteses de alguém morrer num acidente, nas cidades, é 80% morte certa se for acima dos 70 Km/hora”, salientou. “Vamos continuar a precisar de carros, mas vai ser a exceção e não a regra. A regra é que os outros meios de transporte têm de ser mais eficientes”, reforçou. Damiano Cerrone observou ainda que a indústria do estacionamento de carros funciona de forma diferente no mercado. “Quanto mais congestionamento há, paga-se o mesmo. Quanto mais estacionamento estiver ocupado, paga-se o mesmo. E qual é a razão económica de isso ser assim?”, questionou.
Por fim, os oradores explicaram a sua ótica de transporte individual nas cidades do futuro. Mauro Costa Couceiro voltou a salientar que será mais viável para as pessoas possuírem um carro que possa ser partilhado por mais cidadãos, “que está a ganhar dinheiro enquanto trabalho e, depois, está disponível quando tenho de regressar a casa”. Já Francisco Costa acredita em “mais espaços para os cidadãos individualmente e não para os carros. Esta utilização partilhada pode ser muito útil. As pessoas não vão ter necessidade de comprar um carro se tiverem opções mais eficientes”. “As cidades vão acabar por permitir carros só de uma determinada dimensão. O futuro será agora com o mesmo número de carros, mas de menor dimensão”, concluiu Damiano Cerrone.