
Tom Burke: “Há um problema de liderança na ação climática”

O reputado consultor e ambientalista britânico defendeu a redução do custo do capital às empresas que baixam a pegada carbónica. Em entrevista Portugal Mobi Summit disse que é preciso fazer muito mais, do que até aqui, para a mudança climática e aconselhou os jovens ativistas a votar.
Como é que um ativista climático com 50 anos de atividade em diferentes nivéis de influência olha para o ativismo que se faz hoje e para o futuro do planeta? “Apesar dos avanços registados nos últimos anos em várias áreas, as coisas estão a ficar piores, temos de fazer muito mais, se quisermos ter um mundo mais sustentável”, disse Tom Burke, presidente da E3G (um dos 'think tanks' mais influentes na área da mudança climática) numa entrevista Portugal Mobi Summit. Uma das medidas que o consultor tomaria, se tivesse funções governativas, seria baixar o custo do capital para as empresas e tecnologias que reduzissem a pegada carbónica, disse.
Depois de passar por várias dimensões do ativismo, desde os anos 70, e se ter tornado consultor de vários governos no Reino Unido ou de empresas como a BP e a Rio Tinto, Tom Burke entende que o trabalho dos ativistas ao longo deste tempo foi “amplificar as conclusões da ciência”, contribuindo para consciencializar a sociedade sobre os riscos ambientais previstos pelos cientistas. Mas, agora, em plena crise climática, “temos de fazer muito mais, temos de ir além da simples consciencialização e agir”, defendeu o especialista que foi membro do painel de alto nível para o ambiente da OCDE, nos anos 90, e membro da Green Alliance.
Aos jovens ativistas – que têm em Greta Thunberg uma referência e que têm sido notícia nas últimas semanas em Portugal – o experimentado especialista dá um conselho: “votem”. Alertando para o problema de uma parte importante dos jovens não votarem, Burke é perentório: “se acreditam que alguém ou algum partido pode mudar o que vocês querem mudar, votem nele”. Envolver-se mais na política é para consultor britânico o modo mais pragmático de conseguir algumas mudanças ao nível ambiental.
Burke entende que muitos dos avanços registados nos últimos anos se deveram, precisamente, ao ativismo na política, na academia e nas organizações. Mas aponta críticas muito diretas aos governantes, que poderão estar a atrasar a mudança de comportamentos que é necessária para preservar o clima. “Temos um enorme problema ao nível das lideranças”, considera.
“As pessoas no geral tendem a querer ajudar, mas em regra focam-se no que é preciso fazer no imediato para resolver os seus problemas a nível local”. Para irem além do imediato “precisam de uma boa liderança que tenha uma narrativa, que lhes conte uma história sobre o que está a acontecer”. As pessoas “vão ter de fazer escolhas, mas precisam de ter uma razão para o fazer”. E o problema de liderança não se verifica só ao nível dos governos, mas também no seio das empresas e da comunidade, lembrou.
Um exemplo bem ilustrativo é o de explicar porque é que temos de mudar para os veículos elétricos. E, perante o ritmo do aquecimento global, “mudar é urgente, é mesmo urgente”, diz.
Confiante nas capacidades humanas e na tecnologia, Tom Burke considera que, se já conseguimos ter uma tecnologia descarbonizada, podiamos fazer a transição já. O problema, aponta, é que a transformação tecnológica deve andar a par de uma transformação social, não se pode ter uma sem a outra. E a transformação social ainda não aconteceu.
Questionado sobre até que ponto essa urgência é percepcionada pelas corporações, o consultor não tem dúvidas de que “as grandes empresas estão bem cientes da urgência e dos riscos climáticos, embora, às vezes não saibam bem o que podem fazer”. Já as pequenas empresas, diz, “ainda não entenderam que têm de mudar”, nomeadamente no setor do turismo. Não se podem continuar a construir hotéis junto à orla marítima, exemplificou. “O setor financeiro - banca e seguros -, esses já começam a entender que isto (das alterações climáticas) é muito complexo e que é a natureza do próprio risco que está a mudar”.
Para Burke, nesta luta há também de fazer dos antigos adversários aliados. É, por exemplo, o caso da indústria mineira: “vamos precisar muito de mineirais como o cobre ou o lítio”. O “inimigo não está tanto na banca comercial – que precisa de estabilidade para fazer negócios – mas nos hedge funds”, que não tem dúvidas em apontar como um problema. Os que fazem o caos e fazem dinheiro com o caos.
Uma das barreiras enfrentadas pelo ativismo climático é o negacionismo climático, amplificado nas redes sociais e garantindo muitos milhares de seguidores por todo o mundo. Nesta matéria, o especialista defende a responsabilização judicial dos produtores e difusores deste tipo de conteúdos de falsa informação, à imagem do que sucede com os órgãos de comunicação social.
Questionado pelos curadores do PMS, Paulo Tavares e Charles Landry, sobre até que ponto os apelos do secretário-geral das Nações Unidas (ONU) para uma transição energética mais célere estão ou não a surtir efeito, Tom Burke considera que “António Guterres diz as coisas certas, mas os líderes nacionais não parecem estar a ligar ao que ele diz”. Por isso, considera que “é preciso investir mais capital político neste tema”.
Tom Burke é atualmente professor na Cambridge University e associado do Cambridge Institute for Sustainable Leadership e, desde final dos anos 70 até aos dias de hoje, tem ocupado inúmeros cargos de relevância europeia e internacional na temática ambiental.
Carla Aguiar